quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

A impressão

Costuma-se dizer que a criação da prensa gráfica foi um dos grandes feitos de todos os tempos. A prensa gráfica foi inventada por Gutenberg (1398-1468, Mogúncia, Alemanha), em 1450. Ele usou tipos móveis de metal para imprimir o primeiro livro da humanidade: a Bíblia de 42 linhas. Talvez Gutenberg tenha se inspirado nas prensas de vinho de sua região natal, banhada pelo rio Reno, para criar a prensa gráfica.
Antes do invento de Gutenberg, a China e o Japão já se utilizavam da “impressão de bloco”: um único texto, impresso em uma só folha, era entalhado na madeira.
A prensa gráfica se espalhou rapidamente e, em 1500, já haviam sido instaladas máquinas de impressão em mais de 250 lugares na Europa. O contrário ocorreu na Rússia, onde hoje são a Sérvia, a Romênia e a Bulgária. Isso porque a educação formal estava confinada ao clero. Em 1564, um russo levou a técnica para Moscou e teve sua oficina destruída por uma quadrilha.
As maravilhas da invenção da prensa gráfica não foram unanimidade. Os escribas não gostaram nada da novidade e viram seu ofício ameaçado de extinção. A prensa desagradou também aos homens da igreja, já que, com textos impressos, os homens de baixa hierarquia social podiam estudar sozinhos.
O surgimento dos jornais (século XVII) aumentou a ansiedade sobre os efeitos da nova tecnologia. Na Inglaterra, na década de 1660, sir Roger l’Estrange, o censor-chefe de livros, questionava se “mais males que vantagens eram ocasionados ao mundo cristão pela invenção da tipografia”. “Oh, tipografia! Como distorcestes a paz da humanidade!”, dizia.
A explosão da informação constitui-se um problema para os acadêmicos. A propósito, a expressão “explosão”, usada na época, foi uma metáfora imprópria da pólvora. Havia uma dificuldade de recuperar a informação e fazer a seleção e crítica de livros e autores. Havia também a necessidade de métodos para organizar e administrar a informação. Isso se parece com algo que vivemos nos dias de hoje? Na internet, por exemplo, temos muita informação e precisamos aprender a selecioná-la, organizá-la de acordo com nossas necessidades de comunicação.
Antes da invenção da prensa impressora no século XV, os padres, a elite política, os eruditos e os escribas começaram a perder seu monopólio de ler e escrever.
Se no início da Idade Média havia a escassez de livros, no século XVI já havia queixas de que havia tantos livros que as pessoas nem tinham tempo para ler. A enchente de livros resultou na ampliação das bibliotecas. Para encontrar livros nas prateleiras foi necessário criar catálogos por assunto e ordem alfabética de autores.
A invenção da prensa gráfica mudou a estrutura ocupacional das cidades européias (sobretudo da Itália, Alemanha, França): os impressores eram artesãos letrados, surgiram outras ocupações, como vendedores de livros e bibliotecários, corretores de provas tipográficas.

Efeitos do surgimento da imprensa
O surgimento da prensa gráfica ocasionou efeitos semelhantes ao surgimento da escrita para a humanidade: propiciou a disseminação de idéias, promoveu mudanças entre espaço e discurso (as idéias propagadas em um lugar poderiam ser levadas a outro lugar), surgem os diagramas e a organização visual dos livros acadêmicos do século XVI e promoveu a permanência e a fixação das mensagens. As publicações padronizaram e preservaram o conhecimento e deram margem a uma crítica à autoridade, favorecendo a disseminação de diferentes idéias sobre um mesmo assunto.
A diferença fundamental é que a prensa gráfica era potencializada pela automação, tornando os efeitos mais poderosos.
McLuhan chamou de “cultura das publicações”. A historiadora norte-americana, Elizabeth Eisenstein, em estudo publicado em 1979, considera a imprensa “a revolução não reconhecida”. Revisando a importante análise de Elizabeth Eisenstein, décadas depois, é preciso reconsiderar alguns exageros em seus estudos. “As alterações que ela salientou aconteceram por um período de menos de 3 séculos, da Bíblia de Gutenberg à Encyclopedia de Diderot (a famosa Enciclopédia, publicada entre 1751 e 1765 resultou em 35 volumes, num trabalho de D’Alembert, Diderot, Voltaire e Rousseau; tinha o objetivo de despertar a consciência política e transmitir o conhecimento. A publicação da Enciclopédia foi um evento crucial na história da comunicação, dada a sua importância política). É possível uma revolução tão lenta ser considerada uma revolução? A historiadora enfatiza demais a técnica de impressão em detrimento de escritores, impressores e leitores que usam a tecnologia segundo seus objetivos. Esses, sim, são os agentes da mudança. A técnica é mais o suporte do que a origem das mudanças sociais.

O fluxo de informações
O fluxo de informações segue o fluxo do comércio. Os mercadores, por mar ou terra, traziam as novidades com as mercadorias. Segundo o cientista político norte-americano Karl Deutsch, “A comunicação são os nervos do governo”, dada a importância de os governos fazerem suas ordens chegarem aos destinatários. A lentidão entre o envio e recebimento de uma mensagem incomodava e muito os governos.
Os imperadores faziam uso do sistema postal, na chamada Era do Papel (século XVI). O sistema postal era assim chamado porque homens e cavalos estacionavam em postos ao longo das estradas.
Mensagens iam a seu destino a uma velocidade de 10 a 13 km/h. Para se ter uma idéia, o tempo gasto para a chegada de mensagens de Roma a Paris era 20 dias e de Roma a Londres, 30 dias.
A comunicação por mar era mais rápida do que por terra. Os impérios dos primórdios da Europa moderna eram marítimos, com exceção da Rússia. No império russo, uma ordem imperial de Catarina, a Grande (1762-1796), levava 18 meses para ir de São Petersburgo a Kamtchaka, na Sibéria, e outros 18 meses para receber resposta.
Para se comunicar com seus vice-reis no México e no Peru, Felipe II, rei da Espanha, e seus sucessores dependiam de partidas e retornos dos navios que transportavam a prata do Novo Mundo para o porto de Sevilha, utilizando-se, assim, as comunicações (navios) transatlânticas. Cartas da Espanha para o México levavam 4 meses para chegar. Para Lima, de 6 a 9 meses.

Outras formas de comunicação
Comunicação oral na igreja - Na Idade Média, o altar ocupava o centro das igrejas. O sermão dos padres era obrigatório. As possibilidades do meio oral eram reconhecidas como retórica eclesiástica. Para o sociólogo Zigmunt Bauman, os púlpitos da Igreja Católica eram meios de comunicação de massa. Apesar de saudar a técnica da impressão como “graça de Deus”, Martinho Lutero (1483-1546) considerava a igreja como “casa da boca e não da pena”.
Comunicação oral acadêmica - O ensino nas universidades se baseava em palestras, debates formais, discursos ou declarações, testando o poder da retórica (a arte da fala e do gesto).
O canto era outro importante domínio da comunicação oral, especialmente a balada, canção que contava uma história.
Nos boatos ou “serviço postal oral”, as mensagens eram transmitidas em velocidade admirável. Disseminavam-se por motivos políticos ou espontâneos.
A cultura oral esteve presente nas academias, sociedades científicas, salões, clubes, cafés, tabernas, banhos públicos. Contadores de histórias faziam performances orais. Os cafés eram mantidos sob vigilância; os governos preocupavam-se com comentários subversivos.
Na comunicação escrita, a ocupação comum era a de escritor público (ver filme Central do Brasil). Cresce o número de ocupações ligadas à escrita, como conseqüência do letramento: contadores, escrivãos, escritores públicos, carteiros. Quando se fala de meio de comunicação escrito não se refere apenas a manuscritos, pena e tinta. Consideram-se também inscrições e epitáfios.
Comunicação visual – é a linguagem do gesto, muito valorizada na retórica ou nas artes plásticas, como as pinturas.
Imagens impressas / estampa: xilogravura, século XVI – bloco de madeira ou placa de cobre ou aço, com imagem cinzelada na placa (gravada) ou feita por corrosão/ácido (água forte).
Comunicação multimídia – combinava o apelo dos olhos e dos ouvidos simultaneamente; combinava as mensagens verbais e não-verbais, musicais e visuais: peças, balés, óperas, espetáculos (batalhas, execuções públicas), rituais (era uma maneira de transmitir uma mensagem de forma a ser melhor assimilada pela população, criando solidariedade. Ex.: missa, procissão etc.).
Iconotextos – imagens complementadas por textos, necessários para a compreensão de uma mensagem.
Interação/coexistência entre velhos e novos meios de comunicação: os manuscritos continuaram a ser usados (cartas familiares e comerciais), interação entre TV e cinema e interação entre mídia oral e impressa.


Referências bibliográficas:
BELTRÃO, Luiz e QUIRINO, Newton de Oliveira. Subsídios para uma teoria da comunicação de massa. São Paulo: Summus, 1986. P. 21 a 24.
BORDENAVE, Juan Díaz. O que é comunicação. S. Paulo: Brasiliense, 2002 (27a. ed.). P. 12 a 29 e 35 a 41.
GIOVANNINI, Giovani. Evolução na comunicação. Rio: Nova Fronteira, 1984. P. 23 a 83.

Um comentário:

  1. Talvez falte constar nas referências bibliográficas o livro "Uma História Social da Mídia", de onde um trecho deste texto foi claramente copiado.

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